quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

'Abuso sexual' em 50% dos litígios




Entrevista. Presidente do Tribunal de Menores do Funchal, Mário Rodrigues Silva
Qual é a expressão dos casos de síndrome de alienação parental nos processos de regulação do poder paternal?Crescem diariamente nos nossos tribunais os casos em que um dos progenitores manipula os filhos contra o outro progenitor. Mas só nos casos mais graves se pode falar de síndrome de alienação parental, definido como o processo pelo qual um dos progenitores (comummente o progenitor guardião e quase sempre a mãe) se comporta por forma a alienar a criança do outro progenitor. A criança é levada a odiar e a rejeitar o progenitor alienado que a ama e do qual necessita. Há casos em que há obstrução a todo o contacto, invocando-se a razão de que o outro progenitor não é capaz de se ocupar dos filhos e que estes não se sentem bem quando voltam das visitas. Outro argumento é o de que os filhos necessitam de tempo para se adaptarem. A mensagem dirigida aos filhos é que é desagradável ir conviver com o outro progenitor. Mas chega a haver acusações de abuso sexual...Dos abusos normalmente invocados, o mais grave é o abuso sexual, que ocorre em cerca de metade dos casos de separação problemática, especialmente quando os filhos são pequenos e mais manipuláveis. Porém, o mais frequente é o "abuso emocional", que ocorre quando um progenitor acusa o outro, por exemplo, de mandar os filhos dormirem demasiado tarde.Qualquer destas manipulações tem efeitos nocivos nos filhos, que vão desde a depressão crónica, incapacidade de adaptação a ambientes psicossociais normais, transtornos de identidade e de imagem, desespero, sentimento de culpa, comportamento hostil, dupla personalidade, e, até, suicídio em casos extremos. Os estudos demonstram que, quando adultas, as vítimas da síndrome de alienação parental têm inclinação para o consumo excessivo de bebidas alcoólicas e de drogas e apresentam outros sintomas de profundo mal-estar.Algum caso que lhe tenha ficado na memória? Foram vários os casos que me ficaram na memória. Recordo-me de vários processos em que as mães acusavam o outro progenitor de abusos sexuais nos filhos, sendo que, na quase totalidade dos casos, se veio a apurar que as acusações eram totalmente infundadas. Pelo menos num dos casos, o pai decidiu processar criminalmente a mãe dos seus filhos. Um outro caso que me recordo, diz respeito a um pai que residia fora da Madeira, e que, cada vez que vinha visitar a sua filha ao Funchal, a mãe manipulava a filha de tal maneira que a mesma rejeitava por completo qualquer aproximação do pai, chegando inclusive a tentar internar a filha no hospital para que o pai não a visse.Há quem defenda que os tribunais deveriam ter assessores psicólogos para acompanhar os processos. Concorda? Qual é a situação do País nesta matéria? Uma vez que as decisões implicam distinguir o verdadeiro do falso, a fantasia da realidade e a angústia parental da manipulação, parece- -me que sim. Em alguns casos há que lidar com pais que sofrem de perturbações psicológicas, psíquicas, com consumos excessivos de bebidas alcoólicas e de estupefacientes. Muitos dos processos judiciais têm na sua génese e desenvolvimento problemas psicológicos, e enquanto não se resolvem estes, aqueles também não finalizam. Os tribunais de família não dispõem nos seus quadros de assessores, incluindo psicólogos, sem prejuízo da colaboração externa que a este nível prestam os técnicos da Direcção Regional de Saúde e da Segurança Social.

Sem comentários: